Inatos e inetos.

A minha opinião sobre o acordo ortográfico, que não pratico, está resumida aqui:

não é  o mérito do AO que me entusiasma, é a irritação da sanha anti-AO que me causa efeitos. A sanha ignorante, cega, mal-informada, preconceituosa e de má-fé.

Já não me espanta que o conteúdo desta denúncia tenha sido repetido vezes sem conta e não entre na cabeça de quem lidera a oposição à nova ortografia. Os debates de ideias em Portugal são protagonizados por marretas.

21 pensamentos sobre “Inatos e inetos.

  1. 1. O que me irrita mesmo, mas MESMO, nesse senhor, e noutros, está contido no eufemismo que ele próprio escreve: ” é a irritação da sanha anti-AO que me causa efeitos”. Se recuarmos no tempo, eu bem me lembro da tentativa de fazer passar o AO como uma coisa progressista e quem fosse anti-AO era reaccionário. Quiçá fascista! Bardamerda.

    2. A malta que era toda pró-AO, que era uma maravilha, um caso de Progresso, de aproximação da língua ao Povo, que escreveu na altura que todo e qualquer ser falante que se opusesse à treta do Pasteleiro era colonialista de espírito, elitista do ph e do y e reaccionário mesoclítico, em vez de se converter à pressa ao Nin nem sopas dado o descalabro das artes, bem podia ter um pingo de honestidade intelectual ou outra e reconhecer que pôs a pata na poça e a língua num estado de calamidade pública.

    Discordamos em absoluto, portanto.

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    1. Ena, ena.
      Ou ena, Ana.

      Acho que não tem razão.

      1. Nunca aderi ao acordo, nunca o invectivei. Julgo portanto que estou em condições de dar o meu testemunho com frieza: conheço muita gente que aderiu ou não com cautela e caldos de galinha, como aliás deve ser. Essa tentativa de que a Ana fala vem de uma minoria bastante vocal, é certo, e foi compensada pela outra, igualmente vociferante que se lhe opôs, muitas vezes com exemplos errados do uso do acordo.

      2. Nem toda a gente se converteu ao nim (eu já nasci assim). Nem concordo que a língua esteja em estado de qualquer calamidade por causa da ortografia. Está em estado de calamidade por causa da má escrita e das más ideias, o que é toda uma outra conversa.

      3. Está a ser marreta. Mas pronto, toda a gente tem momentos de fraqueza.

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  2. 1. Só num país que acha que a palavra intelectual é ofensa (e não é preciso acrescentar “francês” nem antepor “pseudo”), e cujas elites estão ao nível do Duarte Marques (um deputado para quem as virgulas é quando um homem quiser…) ou do PR (que diz “cidadões” em vez de cidadãos e di-lo duas vezes seguidas…), se pode achar que um assunto como a reforma da língua é um assunto secundário.

    2. Só num país com essas características se pode achar ao mesmo tempo – os portugueses tendem a ter um pensamento muito elástico… – que cabe à cambada de ignorantes (dessas e outras matérias) sentados na AR decidir da ortografia da língua. Se o Estado decide do queijo de azeitão, por que raio não há-de decidir que há-de se passou a escrever há de?

    3. E é assim que num país em que também se acha que para escrever um romance basta papel e lápis e ter ouvido falar de uns traumas infantis, decide que uma questão que é sobretudo técnica é mais ou menos como os quadros do Picasso que a malta se quisesse também tinha pintado quando era pequenino.

    4. E continua a ser assim num país em nunca se discute nada que não venha embrulhado numa retórica vazia de sentido mas sempre carregada de bué de ideologia, em que portanto ser pelo Progresso é achar que Egipto passa a Egito mas os egípcios continuem egípcios e siga a dança, dos véus que vem a propósito.

    5. Uma reforma ortográfica, se necessária e para ser séria, não é uma revolução. É feita com pinças. E não é uma revolução porque a língua é conservadora por natureza. De outra forma, como nos entenderíamos? (e até o Staline percebeu isto…). Acresce a esta banalidade que num país que ainda há 40 anos tinha o maior índice de analfabetismo europeu, o cuidado devia ser redobrado. É por isso que se a malta já escrevia mal, agora escreve péssimo! A começar nessa vergonha que é o Diário da República onde, de facto, se escreve mesmo fato.

    6. E só mais duas coisas porque me cansa estar sempre a repetir o óbvio. Este AO, ao contrário do que nos vendem, não aproximou porra nenhuma. Muitíssimas palavras que tinham dupla grafia passaram a ter três! Muitíssimas palavras que tinham uma só grafia passaram a ter duas (normalmente fica igual no Brasil porque os brasileiros tendem a pronunciar todas as letras). E as consoantes mudas, além de nos permitirem perceber melhor a origem e família das palavras, impediam mesmo que se fechasse as vogais (que nós portugueses já temos tendência para fechar). É também por isso que o argumento idiota do ph não colhe. Porque farmácia ou pharmácia lê-se exactamente da mesma forma (o som é idêntico). Mas se alguém conseguir ler recepção quando vê escrito “receção” eu vou a Fátima de joelhos.

    7. Finalmente, tudo isto não passou de um negócio ínvio para ganhar dinheiro com novos dicionários, prontuários, adaptações de textos à nova grafia, novos correctores online e etc., com a galinha de ovos de ouro dos livros escolares a servir de cereja, que só azedou porque em África cagaram no Acordo e Angola mandou Portugal e o Brasil darem uma curva.
    E o mais ridículo de tudo é que estamos sozinhos nesta choldra, com os brasileiros de pé atrás e a dizerem que a coisa tem que ser estudada & tal… Bom, talvez tenhamos connosco Timor e a Guiné Equatorial…

    E desculpe qualquer coisinha…

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    1. Ok, por partes. Como lhe digo não pratico o acordo. Da minha formação jurídica, perdida no tempo, guardo a noção de que o desuso é a melhor maneira de combater leis patetas.

      Dito isto, não gosto de gente desonesta que discute desonestamente. E o que vi desde os primeiros tempos da oposição ao acordo foi gente a falsear, primeiro por ignorância, depois por má-fé, grafias “escandalosas” que o acordo não admitia sem alternativas. Há agora uns maduros que depois de terem propagado essas grafias falsas para combater o acordo ainda sugerem que o povo é vitimado por uma “insegurança ortográfica” que eles próprios ajudaram a criar.

      E isto também é uma vergonha, Ana.

      De resto, concordo com muito do que escreve.

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  3. DA IGNORÂNCIA ACORDISTA, COM PALAS

    Escreve o bloguista acordista Paulo Pinto a propósito da imagem do próximo fórum anti-AO: «Senhores autores disto, confessem: sabiam que estavam a inventar palavras que não estão contempladas – nem podiam – na supressão de consoantes mudas (que, aliás, por algum motivo se designam assim), não sabiam?»
    Mas que essas palavras não estão contempladas pelo acordo sabemos todos nós. Não foram inventadas por quem é contra, andam por aí nos meios de comunicação social, nas instituições, nos sites do Governo, no Diário da República. Ainda não entendeu o bloguista acordista que são novos erros propiciados pelo acordo? Deve andar completamente desatento. Ou então quer matar o mensageiro. O próprio texto do acordo é ambíguo em várias passagens, o que nas cabeças menos informadas terá o seu efeito. Além disso, o AO veio aumentar a incerteza e insegurança ortográficas, originando fenómenos de hipercorrecção e erros por analogia (por via, sobretudo, das grafias facultativas e inconsistências de palavras cognatas).
    E falta na imagem um corriqueiro “excessão” que já era comum no Brasil e que por cá já se faz notar (http://goo.gl/Ufw6vk).
    Mas palavras para quê, o próprio bloguista acordista afirma: «Não é o mérito do AO que me entusiasma, é a irritação da sanha anti-AO que me causa efeitos.» Isto na linguagem cibernética tem um nome: troll. E pior, com palas.

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    1. “Ainda não entendeu o bloguista acordista que são novos erros propiciados pelo acordo? Deve andar completamente desatento.”

      Ah, deixe-me ver se compreendo. Os opositores do acordo inventam uma ortografia falsa, não legitimada pelo acordo para chocar o populacho. Este, entretanto, desorientado, começa a escrever com os erros que a “insegurança ortográfica” — bom eufemismo para propaganda reles — divulgou e divulga ainda sabendo bem que falseia os termos do acordo.

      E a culpa, na sua pespectiva, não é de quem falseou o acordo mas de quem o assinou? Começo a ficar cada vez mais interessado na conversa.

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      1. Resposta completamente ridícula. Leia bem e releia: os erros apontados não foram inventadas por quem é contra, andam por aí nos meios de comunicação social, nas instituições, nos sites do Governo, no Diário da República. Leia outra vez e entenda de uma vez que esses erros não existiam antes da implementação do AO. Já entendeu finalmente ou a cegueira é assim tão grande? Leia a minha resposta anterior toda novamente. E divirta-se: (…)

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        1. Só aprovo este comentário porque exemplifica bem a presunção redonda e a agressividade deslocada de quem, a propósito deste assunto, por aí anda a fazer as figurinhas que você faz. É o último seu, de qualquer modo.

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  4. Eu estou dispensado de pensar no AO, porque já o aplico de modo automático; tenho uma máquina que o faz por mim no computador. No pouco que escrevo à mão, recordatórios em post-its e pouco mais, quem me dera a mim resolver primeiro os meus problemas sinápticos com a caligrafia para poder perceber se o que escrevo tem problemas com o acordo e até, como desconfio, com a sintaxe e semântica, e daí que para reduzir o risco de este problema se transmitir a outros, sobretudo gente oficial que trata das minhas contas e requerimentos e me pede que escreva, tenha reduzido a minha assinatura a dois riscos e a conversa ao mínimo. Portanto, é-me indiferente o AO enquanto a água sair potável nas minhas torneiras. Mas, por causa de certas coisas, se ultrapassasse a minha preguiça tinha eu agora uma grande vontade de me tornar militante da causa do AO, porque ao contrário do que diz a Ana, faltam de facto militantes à causa, fora uns mavericks que dificilmente preencheriam um papelinho de abaixo assinado em seu apoio e muito menos dariam a morada, com receio de que o Camões os fosse visitar de noute puxado por uma trela pelo Vasco Graça Moura. O que me irrita mais nem é a má fé das invenções de grafias, mas a presunção de que o AO seria uma machadada na educação e fonte de discórdia e desentendimento. Temos agora uma geração de crianças a aprender com o AO e não me dei conta de maiores desentendimentos entre pais e filhos por causa do assunto. Se por vezes tenho problemas de comunicação com o meu, não é por causa do acordo. Percebo tão bem ou tão mal o que ele diz e o que escreve como antes, e se algum dia emigrar e me escrever que está no Egito e que lhe mande peras, pode ele ficar descansado que na semana seguinte seguem peras para o Egito. Sobre cultura e outros ai jesuses semelhantes, talvez a anulação do acordo o não impelisse automaticamente a pedir-me que lhe mandasse no pacote das peras também os sonetos do Sá de Miranda, por falta do produto no mercado do Cairo.
    As publicações oficiais adotam o AO, mas não me parece que esteja prevista qualquer sanção para qualquer paisano que pense e escreva da forma que sempre o fez, ou seja, frequentemente mal, seja qual for a reforma ortográfica pela qual tenha passado. Nem todos podem ser o Pessoa, o tal que recusou até ao fim da vida escrever pela nova ortografia aprovada na época. Pois, ó paladinos da lingua, fosteis cumplices do furto do ípsilon ao fernandinho e ele nunca vos perdoará.
    Dificuldade tive eu com a entrada do euro e as conversões do escudo, isso sim, foi uma reforma traumatizante e continua a ser para muita gente. Ainda hoje tenho que corrigir a minha avó quando promete ao bisneto que lhe dá duzentos mei’reis para comprar a playstation, o que provocaria embaraços não negligenciáveis se esta história fosse real.

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    1. Neste momento até há uma graça acrescida em livros e crónicas da nossa imprensa quando esclarecem que “o autor escreve em bom português de lei”, língua telúrica sem lugar para a homenssexualidade.

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      1. É que já o Viriato escrevia as cartas à Padeira de Aljubarrota, a sua namorada, nesse bom português de lei. Ó cachopa, adoptaste um aspecto formidável na tua última fotografia. Hei-de comer-te toda quando aqui vieres ao monte em Junho.

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  5. Luís, vai desculpar-me a franqueza mas o seu raciocínio é, no mínimo, como direi – rebuscado? Se bem entendo, portanto, a responsabilidade de no Diário da República se escrever “fato” por “facto” é de quem em tempos usou “grafias escandalosas” e mentirosas para combater o AO. Deduzo: ficou-lhes no ouvido o cagado por cágado que se provou ser falso! Ora bolas! Morte então aos anti-acordistas que encheram a cabeça do Povo de grafias obscenas que nunca em momento algum passaram pela cabeça do Malaca Pasteleiro! Olhe que às vezes Luís, ou mesmo quase sempre, o melhor é usar a velha navalha de Occam….
    As pessoas desataram a dar MAIS erros do que já davam por duas razões: 1. um acordo que assenta na oralidade só pode dar merda; 2. um acordo que tem incongruências linguísticas de bradar aos céus só pode dar merda; 3. um acordo que é feito por meia-dúzia de “iluminados” e que faz gato-sapato de TODA a gente que levantou, e continua a levantar, questões pertinentes ao acordo, só pode dar merda.

    Ao menos o António Houaiss foi mais honesto e, já agora, MENOS ignorante (e desculpe as caixas-altas) mas este assunto tira-me do sério, como dizem os brasileiros.
    (Obrigatório ver, para se ver como este país é intelectualmente rasca)

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    1. Pois então, que a tira do sério já tinha percebido. Daí a retirar que eu defendo a “Morte aos anti-acordistas que encheram a cabeça do Povo de grafias obscenas”, etc, vai alguma distância. Acha que o tom do meu post e das minhas respostas é esse?

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    2. Ana, a culpa de um português escrever fato, em vez de facto, não é certamente de um acordo que assenta na oralidade, um dos tais factores que levaria a que as pessoas desse também esse erro. Esse sim, parece-me um argumento rebuscado; eu, pelo menos, não o entendi.
      Fora algumas opções do AO que serão discutíveis, esta discussão, para mim, apenas vale como exercício saudável da má língua, no bom sentido, e da discussão em geral, o que já não é pouco. Pegando no exemplo do Houaiss, o da “actividade” vs “atividade”, não conheço nenhum português que tenha o seu quotidiano minimamente afectado por tal coisa, embora possa admitir que existe um mundo subterrâneo que desconheço. Aliás, reparou como ele pronúncia a palavra, supostamente imitando um português de lei? Em que zona do país se acentua assim a primeira silaba da palavra?
      Eu, por exemplo, já li muita gente indignada por se passar a escrever cagado, em vez de cágado. Ora, passando por cima do facto de afinal o pobre do bicho não perder o assento, eu só posso concluir que tanta indignação e interesse por essa particularidade, se deve a uma de duas coisas: ou são criadores de cágados, preocupados com o desprestígio da função (que diabo pensarão agora as pessoas ao lerem o anúncio?), ou leitores de novelas onde surgem aquelas bucólicas situações, tão frequentes, em que se pode confundir um cágado com um humano com dificuldade em limpar convenientemente o rabo. Seja como for, estou a descobrir um pais interessante.

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  6. Luís, não esperava que me lesse literalmente já que, como bem saberá, a literalidade é a morte de todo e qualquer leitor.

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  7. Caramelo, deixe-me fazer-lhe uma pergunta (e esqueça o cagado que continua a levar acento zoologicamente falando). Antes do Acordo ninguém trocava um fato por um facto, pois não? Ora pense lá então porque será que agora há tanta fatiota à solta. É que isto da causa/efeito nem sempre é uma relação directa, e nem é preciso pormo-nos com histórias de borboletas que batem as asas aqui ou acolá…

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    1. Ana, esquecer o cágado? Ainda ontem sonhei que me saiam cágados pelo nariz. Pensemos ambos. Num país com uma comunidade tão grande de linguistas criadores de cágados, dignos de uma novela do Calvino, se lhe chegasse imaginação para tanto, com uma estranha parafilia por consoantes e acentos, roçando-lhes a lingua, como gosta o mano caetano, mas que por impotência deixaram de sentir, anunciando a coisa sem pudor nenhum nem preocupação pelas crianças que estão a assistir, como não há-de a restante população apavorada sentir-se sugestionada e sentir o mesmo? Em breve perdemos o resto das consoantes e assim batemos orgulhosamente os piranhãs, aquela tribo do amazonas que apenas conhece sete consoantes e passamos a pescar bogas no rio e a comer amoras, com cágados pela trela. Olhe, desculpe, não ligue.

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