De antologia (2).

Da matéria oxigenada em que imergem os blogs raramente sai alguma vida. Qualquer sobredotado é um ideólogo e imensas senhoras transformam as suas secreções num grande amor. Depois há o vício lusitano da sentença, que alimenta os florilégios dos indignados, o frissonzinho da estatística e da escolástica, a tentação irresistível da chalaça. O que falta, quase sempre, é realidade. Ninguém anda de metro, ninguém é despedido, ninguém chega sem dinheiro ao fim do mês. Os dias da semana passam-se a ler e os sábados a viajar pelo Alentejo (sim, os meus também).

Por isso gostei tanto deste texto da Isabel Lucas, em que a autora quase pede desculpa por fazer aquilo que nos compete: falar do que vemos na rua sem o bullshit arrebicado do costume.

24 pensamentos sobre “De antologia (2).

      1. É-me difícil comentar o texto sem referir qual é a minha situação pessoal, do mesmo modo que me é difícil comentá-lo referindo-a. Na primeira hipótese, sinto-me desonesto, porque quando falamos de algo devemos posicionarmos relativamente a esse algo; na segunda, corro o risco de me fazer passar por ‘coitadinho’ (a tal capa que recuso que me assente bem). Durante ano e meio foi algo que não referi no meu blogue — embora considere que em certos casos teria sido importante fazê-lo — por ter receio de não ser capaz de encontrar um ponto de equilíbrio. Em todo o caso, acabei por comentar o texto da Isabel Lucas pouco depois de ter escrito o comentário anterior.

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          1. Luís, as emoções nunca são artificiosas; podemos é ser artificiosos no que concerne à sua manifestação e, evidentemente, podemos optar por não as exteriorizar. Eu, pela minha parte, posso não exteriorizar tudo o que me vai na alma, mas, sempre que exteriorizo algo, faço-o com honestidade e integridade — nesse sentido, nunca fico a meio. E acredito que a opção por «nunca ficar a meio» é algo que nos define.

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  1. Portugal nos blogues parece aquele anúncio do altogedernau, mas com gente mais padreca, muito camilourença. Senti um estranho conforto ao ler o texto da Isabel Lucas. Aquilo é o meu mundo, é onde me sinto em casa. O próximo passo é aparecer alguém que revele que chega ao fim do mês sem dinheiro, aquela gente que vemos na rua, pois. Mas por aqui também não se conhece ninguém que tivesse levado porrada. Eu, por exemplo,estou farto de levar porrada.

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        1. Eu levo porrada no metro todos os dias – agora mais, porque na linha verde as composições só têm 3 carruagens e ainda vamos mais aconchegadinhos, para se não perder pitada da miríade de aromas subterrâneos que o transporte público proporciona. No comboio, sempre de pé, tento não ficar com a gaita à altura de uma gaja boa que vá sentada, porque outros valores se podem confranjedoramente alevantar. Às vezes, é difícil manobrar noutro sentido. É fixe viver em Lisboa.

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  2. Bem evocado. Mais que bem escrito, é escrito por bem. Tanto o seu como o dela. E isso faz toda a diferença.

    Eu, que tinha responsabilidades acrescidas por ter sido um o primeiro da série, deixei-lhe um post inteiro (com muitas fotos de livros como vc. gosta) e a tradução de uma página, que segundo creio nunca foi traduzida em português, de um velho sobrevivente dos campos. Espero que esteja à altura deste seu.

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  3. Já não há recanto no meu serviço onde não se devore uma marmita. Estou, neste preciso momento, a devorar uma belíssima bolonhesa de atum. E os incomodadinhos que se queixam do cheiro a comida? Putá qui páriu!

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  4. se fosse oxigenada teria obviamente de ter vida uma vez que o oxigénio (livre) é um sub-produto da vida logo:

    Da matéria pútrida em que estão imersos os blogs raramente sai alguma vida…que respire ou produza oxigénio

    Qualquer sobredotado (existem sobredotados? começa nos 10centímetros?)

    Depois há o vício lusitano…de ver lusitanos numa mistela de povos
    da sentença, que alimenta os florilégios dos indignados,

    o frissonzinho da estatística e da escolástica, ..escola por similitude de iniciais …porque não da contabilidade e da catarse psica na lítica

    a tentação irresistível da chalaça. …o humor é muito subjectivo…a chalaça é uma arte da ralé…

    O que falta, quase sempre, é realidade….ahn

    Ninguém anda de metro,…aqui chamamos-lhe esgoto…

    ninguém é despedido, …aqui chama-se sub-empregado no gamanço

    ninguém chega sem dinheiro ao fim do mês….raramente o temos no princípio logo é uma impossibilidade

    Os dias da semana passam-se a ler…cansa a vista e os sábados a viajar pelo Alentejo…o qué cus alfacinhas têm com o alentejo

    é a sensação do abysmo…pois

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